Deuses do vinho: os 11 mestres mitológicos da viticultura mais conhecidos

Ao longo da história da humanidade, poucas bebidas tiveram tanto significado cultural e espiritual como o vinho. O vinho está no centro dos rituais, celebrações e laços sociais desde a antiguidade. Mais do que uma bebida, o vinho tornou-se um símbolo que reflete o espírito e a identidade de uma comunidade. Esta bebida sagrada tem desempenhado um papel importante em muitos eventos, desde festivais de colheitas a cerimónias religiosas. Neste contexto, as figuras mitológicas associadas ao vinho têm surgido em muitas civilizações ao longo dos tempos.

Aguna

Aguna, também conhecido por Anguna, pode ser considerado um dos deuses do vinho no Cáucaso. Está associado à abundância, fertilidade e significado espiritual do vinho na cultura georgiana. Nos textos mitológicos, Aguna é frequentemente retratado como o protetor das vinhas. Particularmente nas regiões do oeste da Geórgia, como Guria e Lechkhumi, os rituais e cerimónias dedicados a Aguna sobreviveram durante muito tempo.

O facto de a palavra “angur” significar “uva” na língua persa indica ligações culturais e linguísticas entre a mitologia georgiana e a cultura persa.1

Amphictyonis

Amphictyonis, ou Amphictione, era uma figura intrigante da mitologia grega antiga. Como deusa do vinho e da amizade, desempenhou um papel significativo na vida cultural da Grécia antiga. Imagine estar em Delfos, um movimentado centro de atividades religiosas, onde Amphictyonis foi homenageado. O seu próprio nome sugere uma união, um unificador, que é exatamente o que o vinho fez na sociedade grega. Quer tenha sido durante uma bebida casual ou num grande simpósio, Amphictyonis foi a força divina por detrás destas reuniões, promovendo a hospitalidade e a camaradagem.

Para além do vinho, Amphictyonis era também a deusa dos simpósios, aquelas animadas festas gregas onde as melhores mentes debatiam filosofia, política e poesia. Eram mais do que meros acontecimentos sociais. Eram banquetes intelectuais, e Amphictyonis assegurou que o vinho fluísse da forma certa para manter o fluxo das ideias e das conversas. Na sua essência, ela não tratava apenas da bebida em si, mas das experiências e das ligações que esta facilitava.

Ash

Ash, por vezes referido como o deus egípcio do vinho e dos oásis, é uma divindade menos conhecida na mitologia egípcia antiga. Era considerado o guardião do deserto ocidental e dos seus preciosos oásis, vitais para a vida e o sustento. A ligação de Ash ao vinho decorre do seu papel como protetor destas regiões férteis onde as uvas eram cultivadas e o vinho era produzido.

Na sociedade egípcia antiga, os oásis representavam um santuário e uma fonte de vida no meio do deserto agreste. Ash, como deus que supervisiona estas áreas, tornou-se associado à generosidade e à fertilidade que proporcionavam, incluindo a produção de vinho. Esta associação fez dele um símbolo de prosperidade e celebração, já que o vinho desempenhava um papel significativo tanto nos rituais religiosos como na vida quotidiana no Egipto.

Ceraon

Ceraon pode não ser tão conhecido como algumas outras divindades, mas o seu papel na mitologia grega é fascinante. Era o semideus da mistura de vinho, o que pode parecer simples, mas na verdade era um aspeto crucial da cultura grega de beber. Os gregos misturavam frequentemente o vinho com água para moderar a sua força, tornando-o mais adequado para longas discussões e socialização.

Ao supervisionar esta prática, Ceraon garantiu que o vinho fosse apreciado de forma equilibrada e civilizada. Esta moderação refletia valores gregos mais amplos de harmonia e autocontrolo. De certa forma, Ceraon foi o guardião do consumo consciente e responsável, promovendo uma apreciação do vinho que ia para além da mera embriaguez.

Dionísio

Dionísio, um dos deuses do vinho proeminentes na mitologia grega, é uma figura de imensa complexidade e encanto. É frequentemente descrito como um deus jovem e efeminado, personificando o poder extático e transformador do vinho. Nascido da coxa de Zeus, a sua história de origem por si só é suficiente para despertar a imaginação. Os seus seguidores, as Ménades ou Bacantes, eram conhecidos pela sua adoração selvagem e extática, que envolvia dança, música e, claro, muito vinho.

Dioniso representa a alegria e o caos que o vinho pode trazer. As suas festas, tal como as Dionísias, não eram apenas para beber. O povo celebrava a criatividade humana e a capacidade de transformação. O vinho, sob a influência de Dioniso, tornou-se um canal para explorar verdades mais profundas e experimentar a vida nas suas formas mais vibrantes e caóticas.

Baco

Baco – Deuses do Vinho
“Sacrifício a Baco” (Massimo Stanzione, 1634)

Baco, a contraparte romana de Dioniso, era o deus do vinho, da fertilidade e das celebrações extáticas. As Bacchanalia, festivais dedicados a Baco, eram lendas, conhecidas pela sua folia selvagem e desinibida. Imagine-se numa destas festas antigas, com música, dança e muito vinho. Foi uma celebração dos prazeres e das liberdades da vida.

Baco não era apenas uma festa. A sua mitologia é rica em temas de transformação e libertação. Era visto como um deus que podia libertar as pessoas das suas preocupações quotidianas e das normas sociais, encorajando-as a abraçar o seu verdadeiro eu. A dualidade do vinho como lubrificante social e experiência mística está perfeitamente incorporada em Baco. Representa a alegria e o caos que o vinho pode trazer, refletindo a nossa complexa relação com esta bebida milenar.

Du Kang

Du Kang, considerado o lendário inventor do vinho na mitologia chinesa, tem uma história que ressoa com o encanto das descobertas antigas. Reza a lenda que Du Kang tropeçou acidentalmente no processo de fermentação, levando à criação do vinho. Esta descoberta fortuita teve um impacto profundo na cultura chinesa, onde o vinho se tornou um símbolo de celebração e hospitalidade.

O legado de Du Kang estende-se à literatura e à história chinesas. É frequentemente mencionado na poesia clássica, simbolizando a alegria e a tristeza que o vinho pode trazer. O seu nome tornou-se sinónimo de vinho de alta qualidade, reflectindo o profundo apreço por esta bebida na sociedade chinesa. O vinho, no contexto da história de Du Kang, não é apenas uma bebida, mas um tesouro cultural.

Hathor

Hathor, uma antiga deusa egípcia, é uma figura fascinante associada ao amor, à beleza, à música e à embriaguez. Muitas vezes retratada com chifres de vaca, Hathor era uma divindade carinhosa e alegre que trazia felicidade e celebração ao povo. Esteve intimamente ligada à produção e consumo de vinho, que desempenhou um papel significativo na vida religiosa e social egípcia.

Os festivais de Hathor eram eventos animados repletos de música, dança e bebida, refletindo o seu papel como deusa da festividade e da alegria. O vinho era fundamental nestas celebrações, simbolizando as bênçãos de Hathor e os prazeres da vida terrena. A sua associação ao vinho realça a sua importância na cultura egípcia antiga, onde não era apenas uma fonte de alegria, mas também um meio de ligação com o divino e de celebração dos ciclos da vida e da natureza.

Liber

Liber, o deus romano da viticultura e da liberdade, partilha muitos atributos com Baco. Como divindade da agricultura e da fertilidade, Liber foi crucial para o sucesso das colheitas das uvas e da produção de vinho. O festival Liberalia celebrou a sua influência com rituais e festividades que realçaram a alegria e a liberdade que o vinho pode trazer.

Na cultura romana, o Liber representava mais do que apenas os aspetos agrícolas do vinho. Simbolizou os efeitos libertadores do vinho, a sua capacidade de promover laços sociais e aumentar o prazer da vida. O seu duplo papel como deus da fertilidade e da liberdade realça a interligação entre o sucesso agrícola e o bem-estar social, reflectindo a importância do vinho nas esferas pública e privada da vida romana.

Siduri

Siduri, uma personagem da Epopeia de Gilgamesh, é um sábio taberneiro que oferece sábios conselhos ao herói Gilgamesh na sua busca pela imortalidade. Ela aconselha-o a abandonar a sua busca pela vida eterna e, em vez disso, a abraçar os prazeres simples do mundo, incluindo o prazer do vinho e da boa companhia.

A sabedoria de Siduri destaca a antiga visão mesopotâmica do vinho como fonte de conforto e prazer perante as incertezas da vida. O seu papel como figura hospitaleira e perspicaz incorpora os valores culturais do seu tempo, onde o vinho era valorizado não só pelos seus efeitos inebriantes, mas pela sua capacidade de unir as pessoas e proporcionar momentos de alegria e reflexão.

Sileno

“Sileno bêbado” (Pomponio Amidano – 1600s)

Sileno, companheiro e mentor de Dionísio na mitologia grega, é frequentemente descrito como uma figura jovial e embriagada que representa os aspetos selvagens e caóticos do vinho. Apesar do seu perpétuo estado de embriaguez, Silenus é também conhecido pela sua profunda sabedoria e capacidades proféticas, encarnando o complexo carácter do vinho como libertador e esclarecedor.

Os contos de Silenus envolvem frequentemente temas de transformação e fusão dos reinos mortal e divino. A sua associação com Dioniso sublinha a profunda ligação entre o vinho e o divino, onde era visto como um meio de aceder a verdades maiores e de experimentar o potencial máximo da vida. A sabedoria de Silenus, apesar da sua embriaguez, serve como um lembrete das profundezas ocultas e dos insights que o vinho pode revelar.

    1. Georgia, the Cradle of Wine. Georgian Folklore Magazine[]